Mostrando postagens com marcador YA. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador YA. Mostrar todas as postagens

Eu Nasci Pra Isso - Alice Oseman

22 de dezembro de 2023

Título:
 Eu Nasci Pra Isso
Autora: Alice Oseman
Editora: Seguinte
Gênero: Romance/Jovem Adulto
Ano: 2023
Páginas: 368
Nota:★★★★☆
Sinopse: Angel Rahimi está prestes a realizar o sonho de qualquer garota: ir para Londres com a melhor amiga para assistir ao show do Ark, sua boyband favorita. Angel faz parte do fandom da banda há anos, e foi ali ― em meio a fóruns, fanfics e postagens nas redes sociais ― que encontrou amizades verdadeiras e um lugar no mundo.
Jimmy Kaga-Ricci é o vocalista do Ark, e deve tudo o que tem ao grupo. Shows lotados, fãs apaixonados e festas com celebridades são comuns em sua rotina, mas o sucesso cobra um preço caro, e ele sofre cada vez mais com crises de ansiedade e paranoia.
Os caminhos de Jimmy e Angel se cruzam justo quando ele começa a questionar se a fama é algo que realmente deseja, e ela a se perguntar se o amor que sente pelo Ark só é tão grande porque a ajuda a fugir de seus problemas. Entre conversas sobre música e surpresas inesperadas, esta é uma história sobre o poder de acreditar em alguma coisa ― especialmente em si mesmo.

Resenha: Saindo do universo de Heartstopper, Alice Oseman trouxe Eu Nasci pra Isso, publicado no Brasil pela Seguinte, que vai contar a história de Angel e Jimmy.

Fereshteh Rahimi (ou Angel, que é o apelido que ela usa na internet e como prefere ser chamada) é muçulmana, tem 18 anos, acabou de se formar no ensino médio e pretende fazer faculdade de psicologia. Já faz anos que Angel faz parte do fandom da sua boyband favorita de pop rock, a banda Ark, que ela vive pra idolatrar. Como ela não conhecia ninguém que dividisse esse amor pela banda como ela, Angel passou a investir seu tempo em fóruns e postagens em redes sociais pra procurar saber tudo sobre os meninos e poder conversar sobre eles com quem também tivesse o mesmo interesse, e foi nesse espaço virtual que ela se encontrou e podia ser e agir como ela mesma. Numa dessas, ela conheceu Juliet, que compartilhava da mesma paixão pela banda e se tornou sua melhor amiga. As duas tem a mesma idade e levam essa amizade movida pelo Ark já faz dois anos, e agora Angel e Juliet estão prestes a realizar o maior sonho de suas vidas: Viajar para Londres para assistir ao show da banda.
Do outro lado, Jimmy faz parte do Ark e nao está sabendo lidar muito bem com a ideia de ser uma celebridade adorada, e sofre cada vez mais com crises de ansiedade, ataques de pânico e paranoia.
Até que os caminhos de Angel e Jimmy se cruzam num momento onde eles passam a se questionar sobre o que querem da vida, e se o que estão vivendo vale a pena...

A história se passa num período de uma semana e pra cada dia há os pontos de vista intercalados de Angel e Jimmy para o que vai acontecendo. Os capítulos (o dia da semana) são iniciados com alguma citação de Joana D'arc e parece servir de referência para uma música da banda, a "Joan of Arc".
A narrativa é feita em primeira pessoa e é bem leve e fluída, mas é bem diferente das HQs da série Heartstopper da autora. Acho que não teria como ser de outra forma já que, aqui, ela precisou concentrar num único volume as descrições mais detalhadas de personalidade e percepção de mundo dos personagens. Não sei se o livro faz parte de uma série, mas até aqui achei tudo em apresentado e bem definido.

Angel é "estranha", seus pensamentos vivem se atropelando e ela guarda pra si a maioria deles. Às vezes, ela prefere ficar desconfortável numa situação do que pôr pra fora o que pensa e sente mas, em outras vezes, fala demais a ponto de passar dos limites, e isso é um pouco irritante.
Jimmy é um jovem trans, guitarrista da banda, que sofre de ansiedade e ataques de pânico. Ele parece não ter se acostumado com o sucesso da banda e agora precisa lidar com toda a pressão que a fama trouxe para a sua vida.
Rowan e Lister são os outros dois membros do Ark que também tem seus dilemas com relação a fama e à vida pessoal deles, que diga-se de passagem, é tão interessante quanto as dos protagonistas. Seus arcos e personalidades foram muito bem construídos e o conjunto de amizade e fama dos três forma uma dinamica muito legal de se acompanhar.

Embora cada um tenha um tipo de representatividade com relaçaõ à sexualidade, isso nao é o que os define como pessoas ou o que define os aspectos de suas vidas, apenas faz parte de quem eles são. O que entra em jogo aqui, além das questões psicológicas que eles enfrentam, é a dinâmica entre celebridade e fã, o que é um excelente ponto de reflexão para os leitores numa época em que a gente vê o que acontece e tem exemplos, na maioria das vezes, bem desagradáveis. O livro explora muito bem a questão da relação entre fã e ídolo, mostrando os dois lados da história. Enquanto Angel ama fazer parte do fandom, ela descobriu alí algo que a faz feliz e fez amigos verdadeiros mas, por outro lado, toda essa paixão e intensidade dos fãs, fez com que ele se sentisse sufocado, e Jimmy - assim como seus amigos - acabou sendo afetado de forma muito negativa, principalmente pelo fato de que sempre há aquele tipo de midia oportunista que sai divulgando toda e qualquer "notícia" da forma mais conveniente pra eles, visando cliques e lucro por saber que há um bando de desmiolados que consome esse tipo de conteúdo como se não houvesse amanhã, e azar se alguém vai sofrer com isso ou não.

Percebi que a autora sempre tem uma forma diferente, num contexto diferente, e com personagens diferentes, para falar de representatividade LGBTQIA+ e saúde mental, e sempre da forma mais compreensível possível, e com o devido respeito, pra que possa fazer todo mundo que lê suas obras poder refletir sobre a importância do tema.

Não vou dizer que foi meu livro preferido da autora pois, por mais que eu também tenha vivido essa fase de ser fã de boybands na adolescência (Backstreet Boys e Hanson quem o diga), eu nunca tive essa obsessão a ponto de fazer parte de clubinhos, fandons, ir em shows e afins, logo, apesar de entender essa paixão, não pude me identificar tanto assim. Outra coisa que ainda não sei se, pra mim, foi positiva ou não é que, por mais que os personagens passem por uma experiência que faz com que eles amadureçam e entendam várias coisas da vida, não significa que eles tenham um final feliz. Claro que na vida real é o mais óbvio de se acontecer, mas às vezes a gente só quer ler algo pra fugir da realidade, e não que essa realidade fictícia nos dê mais uns tapas na cara. Mas, posso dizer que é um livro bem legal e que aborda temas super atuais, como a vida online ser bem diferente da vida real, sobre música, sobre consequências de se ter obsessão por celebridades e a necessidade de fazer parte de algo pra se sentir aceito, sobre ter a vida virada de cabeça pra baixo quando a fama vem muito rápido, e claro, sobre saúde mental, e, tudo isso, focando no quanto os personagens são muito humanos e no desenvolvimento da amizade que eles cultivam, em vez do romance convencional. E isso pra mim foi um respiro longe dos clichês tradicionais.

As Foices - Neal Shusterman

4 de dezembro de 2023

Título:
 As Foices: Contos do Universo de Scythe
Autor: Neal Shusterman
Editora: Seguinte
Gênero: Distopia/Jovem Adulto
Ano: 2023
Páginas: 416
Nota★★★★☆
Sinopse: Em treze contos inéditos, Neal Shusterman e mais seis grandes autores da literatura jovem nos fazem viajar pela linha do tempo da trilogia Scythe e revisitar os conflitos dos ceifadores.
Depois do último volume da trilogia Scythe, ainda existem inúmeras histórias da era pós-mortal para serem contadas. Afinal, a humanidade pode até ter vencido a miséria, as doenças e a própria morte, mas nem mesmo a inteligência artificial da Nimbo-Cúmulo foi capaz de resolver todas as angústias e os conflitos éticos dos seres humanos ― especialmente dos ceifadores.
Com a colaboração dos autores David Yoon, Jarrod Shusterman e Sofia Lapuente, Joelle Shusterman, Michael H. Payne e Michelle Knowlden, Neal Shusterman nos mostra quão extenso, intrigante e arrebatador é o mundo distópico de Scythe. Em treze histórias que se passam antes, durante e depois dos eventos retratados na série, essa coletânea segue investigando as aflições e os questionamentos de todos os indivíduos diante dessa sociedade distópica.

Resenha: Fazendo um apanhado geral, a trilogia Scythe, escrita pelo autor Neal Shusterman, é uma distopia futurística que aborda a superação humana sobre todos os malefícios da vida a ponto de a morte ser algo completamente contornável, mas ainda assim necessária. Nesse cenário, onde ciência e tecnologia venceram, Citra e Rowan são dois adolescentes que entram para a Ceifa e se tornam aprendizes de ceifadores, que são aqueles responsáveis por "coletar" vidas a fim de manter o equilíbrio populacional. É um trabalho difícil, mas bastante nobre e respeitado por todos devido à sua importância. Porém, no desenrolar da trama, eles acabam descobrindo que a Ceifa foi corrompida e alguns ceifadores imorais, deslumbrados com esse poder, estavam indo contra as leis absolutas criadas pela inteligência artificial que governa o mundo visando o melhor para a humanidade, a Nimbo Cúmulo. Logo, o casal de protagonistas se infliltra nesse meio pra tentarem dar jeito nesse problema.

Com a trilogia concluída, o autor, em cooautoria com outros seis escritores de literatura juvenil, apresentou treze contos que se desenrolam antes, durante e após os eventos da série, formando histórias individuais e bastante convincentes. Esses contos buscam explicar e aprofundar-se em algumas situações, investigar questionamentos e aflições individuais, destacando que, apesar da humanidade estar na era pós-mortal e ter superado adversidades e a própria morte, nem mesmo a Nimbo-Cúmulo conseguiu resolver as questões mais íntimas dos seres humanos, incluindo a moralidade dos ceifadores, que é um dos pontos mais interessantes da série.

Scythe é uma das distopias mais incríveis que já li e, quando vi que um livro de contos desse universo seria lançado, fiquei bastante empolgada pra matar a saudade. O problema é que a experiência não foi como eu imaginei. Acho que livros de uma série que tem um intervalo grande de lançamento entre eles acabam quebrando o clima de leitura, às vezes sendo preciso até a necessidade de reler os livros anteriores para que os detalhes sejam relembrados e os personagens reconhecidos. O primeiro livro foi lançado em 2017 e a sequência saiu em 2018. O desfecho foi sair em 2020 e agora, três anos depois, sai o livro de contos. Acho que eu teria gostado e me envolvido muito mais se esse intervalo fosse menor, justamente pra não dar tempo de "esfriar" o interesse.

Não vou me aprofundar muito em cada conto, mas já adianto que dos 13, achei que só a metade foi relevante e realmente acrescentaram algo ao que já foi estabelecido. O 6º conto, entitulado "Um Minuto Marciano", talvez tenha sido o mais interessante da coletânea pois vai abordar a origem de Goddard em meio a um cenário de colonização em Marte. O conceito de colonos interplanetários foi incrível mostrando Marte sendo preparada para futuros moradores. Goddard foi um vilão ardiloso por toda a trilogia, então achei super interessante voltar ao passado dele e ter esse vislumbre de sua juventude no espaço.

Os melhores contos foram aqueles que falaram sobre personagens já conhecidos. Senti falta da presença de Citra e Rowan nesses contos pois, afinal, eles eram os protagonistas. Aparecer somente em menções feitas pelos outros foi um pouco frustrante. Os contos são narrados em terceira pessoa e às vezes há uma leve mudança de tom devido ao fato de alguns deles terem sido escritos em conjunto com outros autores, mas num geral, os contos foram divertidos e conseguiram trazer várias mensagens que causam impacto e enriquecem a história como um todo.

No mais, se você gostou da trilogia, com certeza vai se surpreender e aproveitar muito. Embora alguns contos pareçam não acrescentar muita coisa, não deixa de ser uma forma do autor ampliar a dinâmica e a visão de determinadas situações, responder perguntas que ficaram sem respostas e enriquecer ainda mais o universo que ele criou. Se você nunca leu os livros anteriores, este não fará sentido nenhum, então corre pra ler primeiro que vale a pena demais.

Perfeita (na teoria) - Sophie Gonzales

17 de outubro de 2023

Título:
 Perfeita (na teoria)
Autora: Sophie Gonzales
Editora: Seguinte
Gênero: Jovem Adulto/Romance
Ano: 2023
Páginas: 352
Nota:★★★★☆
Sinopse: Darcy Phillips tem a solução ideal para qualquer problema de relacionamento. Pelo armário 89 do colégio, ela recebe cartas desesperadas de alunos pedindo conselhos e depois responde tudo por um e-mail anônimo ― mediante pagamento. É o negócio perfeito.
Ironicamente, sua vida amorosa é um desastre: há anos, ela é apaixonada por sua melhor amiga e não tem coragem de se declarar. Mas Darcy convive bem com todos esses segredos, até que Alexander Brougham, o atleta da escola, a flagra pegando as cartas do armário e coloca tudo a perder.
Em troca de manter seu anonimato, ela concorda em ajudar Brougham a voltar com a ex-namorada. Parece uma tarefa simples: dar umas dicas para um cara gato (mas muito arrogante) a reconquistar uma garota que já foi completamente apaixonada por ele. Mas Darcy logo vai descobrir que nada é tão simples quanto parece.

Resenha: Darcy Philips é o tipo de garota que não só ajuda os amigos dando dicas objetivas para resolver seus problemas amorosos, ela também os ajuda a enfrentar suas questões emocionais e é a consultora de relacionamentos da escola. Darcy faz tudo isso mantendo sua identidade em segredo: ela recebe cartas com pedidos de socorro que os alunos colocam num armário sem dono da escola, pega tudo secretamente e depois responde o povo por um email anônimo sob o pseudônimo de "Armário 89", dando a solução pro problema que for, e ainda ganha uns trocados com esse "serviço". A hipocrisia nessa história é que Darcy, que é bissexual, é apaixonada por sua melhor amiga, Brooke, mas não tem coragem de se declarar, e fica nesse impasse.
Até então ela convive bem com a forma como está levando sua vida e seu negócio secreto, mas isso foi até Alexander Brougham, o atleta babaca da escola, ver Darcy pegando as cartas no famigerado armário e descobrindo a identidade secreta da famosa consultora. O espertinho poderia colocar tudo a perder mas, em troca de manter o bico calado, ele chantageia pede ajuda a Darcy para voltar com a ex namorada. A princípio, a tarefa era algo simples e nada que fugisse do que Darcy já tem costume de lidar, mas não dessa vez... Brougham, o cara que ela considera o maior idiota da escola, começa a atrair sua atenção. E o dilema não pára por aí, pois ainda existe o risco de Brooke descobrir tudo e Darcy perder a amizade dela. E agora?

Narrado em primeira pessoa, Perfeita (na teoria) é um romance leve, envolvente e muito bem escrito, com toques de um humor autodepreciativo que aborda a vida e o cotidiano de adolescentes que são imperfeitos, assim como qualquer pessoa, que cometem erros, que guardam segredos, que magoam os outros, mas aprendem com eles e ainda amadurecem. Os personagens tem uma dinâmica muito boa, independente do grau de proximidade ou parentesco que tenham, o que deixa a história movimentada e bastante fluída e, além disso, o elenco tráz uma representação LGBTQIA+ incrível.
Além da protagonista bissexual, Brooke é lésbica, a irmã de Darcy está em transição, e elas ainda fazem parte do grupo Queer da escola.

É interessante acompanhar Darcy e seus dilemas, pois ela é a especialista, tem respostas pra tudo, sabe resolver os problemas amorosos dos outros caso contrário devolve o dinheiro deles, mas por mais que seus conselhos e orientações sejam totalmente eficazes, eles não servem pra ela mesma pois é muito mais fácil ver a situação de fora e não estar emocionalmente envolvido no caso. E geralmente é isso que acontece com as pessoas comuns, que vivem dando palpites nos relacionamentos alheios quando vêem as coisas erradas, mas não conseguem enxergar o que elas mesmas vivem para seguir o conselho mais óbvio e que talvez ela mesma daria pra outra pessoa vivendo a mesma situação.

A questão da bissexualidade de Darcy foi explorada de uma forma super inteligente, mostrando inclusive o lado da bifobia, mas achei legal a história se passar em meio a adolescentes, pois geralmente é a época da descoberta, onde os envolvidos passam pelos maiores conflitos pessoais e as autodescobertas. É um drama de ensino médio aparentemente "bobo"? Talvez, mas eu achei super válido e é aquele tipo de leitura que faz o leitor refletir, que esclarece muito sobre sexualidade e ainda dá aquele quentinho gostoso no coração pelas coisas que vão acontecendo, principalmente quando Darcy e Brougham vão se aproximando mais e ele se revela alguém super fofo e respeitoso, e não aquele imbecil que ele parecia ser no início. É muito satisfatório acompanhar um personagem masculino que respeita limites, as vontades e a opinião das outras pessoas, ainda mais quando são mulheres. Parece uma coisa boba, ainda mais vindo de adolescentes, mas é algo muito bacana de se acompanhar quando a gente pensa que aqui na vida real tem um bando de neandertais a solta por aí que estão pouco se lixando pro que as mulheres são, pensam e querem de verdade.

No mais, é aquele tipo de livro pra sair de uma ressaca literária, pra ler sem compromisso e se divertir, pra rir, pra chorar e pra morrer de amores.

Nevasca - Dhonielle Clayton, Tiffany D. Jackson, Nic Stone, Angie Thomas, Ashley Woodfolk e Nicola Yoon

27 de agosto de 2023

Título:
Nevasca
Autoras: Dhonielle Clayton, Tiffany D. Jackson, Nic Stone, Angie Thomas, Ashley Woodfolk e Nicola Yoon
Editora: Seguinte
Gênero: Romance/Jovem Adulto
Ano: 2023
Páginas: 320
Nota:★★★★☆
Sinopse: A quatro dias do Natal, a cidade de Atlanta se vê coberta de neve. E Stevie se vê prestes a perder a namorada para sempre. Afinal, Sola deu um ultimato: se Stevie não compensar o grande erro que cometeu até a meia-noite, o relacionamento das duas terminará de vez.
Stevie nunca foi de fazer grandes gestos românticos, mas dessa vez terá que caprichar. Para isso, ela vai contar com a ajuda de seus amigos, cada um responsável por uma pecinha do grande plano para reconquistar Sola. O que eles não esperavam era ter que lidar com seus próprios sentimentos, romances mal resolvidos, e com a neve que não para de cair.

Resenha: Nevasca reúne contos escritos pelas mesmas autoras de Blackout, que narram histórias de amores mal resolvidos mantendo a mesma abordagem LGBTQIA+ e representatividade negra que caracterizam a antologia anterior. Apesar de terem uma estrutura diferente, Blackout se passa num verão escaldante e tráz histórias que vão se interligar em meio a um apagão em Nova York, Nevasca narra as histórias no inverno, durante uma grande nevasca que ocorre em Atlanta e provoca um enorme caos faltando quatro dias para o Natal.

O livro traz um enredo principal onde Stephanie, ou Stevie, uma adolescente de dezesseis anos e aspirante a cientista, acabou estragando seu namoro com Adesola, ou Sola, quando decidiu fazer um experimento científico com o próprio relacionamento antes de ir para um jantar bastante especial com a família da namorada, e tudo deu errado. Depois do evento fatídico, ela volta pra casa, fica de castigo e sem celular ou qualquer outro meio de comunicação, não consegue responder as mensagens de Sola que, então, resolve lhe dar um ultimato: Stevie tem até a meia-noite para fazer uma reparação significativa para merecer ser desculpada, caso contrário será tarde demais. Então, ela bola um plano e pede ajuda para seu grupo de amigos, Kaz, Porsha, E.R, Jimi e Ava numa tentativa deles ajudarem a consertar as coisas. O problema é que Atlanta foi tomada pela nevasca atípica e pelo caos que veio junto com ela, atrapalhando todo mundo.

A narrativa é feita em primeira pessoa com onze capítulos que trazem o nome da personagem que está contando a situação, onde ela está, a hora e quanto tempo falta para a famigerada meia-noite, como se fosse uma contagem regressiva pra mostrar que o tempo que Stevie tem pra dar jeito no problema está se esgotando. Cada um desses amigos de Stevie também têm suas questões e dilemas relacionados aos seus relacionamentos, que trazem diversidade e representatividade, que são apresentados em seus respectivos capítulos e se alternam com os de Stevie. Os desafios que eles enfrentam devido a nevasca acabam contribuindo pro ar de tensão nas histórias, que vai além dos amores mal resolvidos.

Stevie - ★★☆☆
Sobre os personagens, acho que ou a gente ama ou odeia, e a protagonista Stevie foi a que mais despertou meu revirar de olhos, o que chega a ser até absurdo considerando que a história dela é a principal. Os capítulos destinados à ela (1, 3, 7, 9 e 11) são mais curtos por acrescentar algumas outras informações e lembranças marcantes que vão formando a história, mas é difícil acompanhar uma personagem que lembra um Sheldon Cooper de The Big Bang Theory, especialmente quando ela mesma diz que tem o "gênio difícil". Ela parece não ser capaz de entender o que é estar apaixonada a ponto de querer fazer experimentos científicos pra ter uma resposta, e não sabe bem como demonstrar afeto, mesmo que se esforce, mas a verdade é que só reparei na forma que ela se acha superior, acha que os outros devem ficar a sua disposição pra resolver problemas que ela mesma causou, e tem pouca sensibilidade quando o assunto diz respeito aos sentimentos de Sola, talvez por ela ter muita dificuldade em demonstrar os seus próprios. Nem a forma bonita como ela descreve os detalhes das experiências legais e de tudo o que ela observa na namorada salvou, e nem a conversa com Ern, o irmão de E.R., onde ela expõe tudo o que está entalado e a fazendo sofrer. Eu criei uma imagem super negativa dela como pessoa que inteligência nenhuma supera . A história dela só é razoavelmente aceitável por causa do desfecho, a forma que ela encontra pra se desculpar com Sola é realmente uma gigantesca prova de amor (cafona, não nego, mas o que vale é a intenção), mas os amigos ficaram encarregados de grande parte do serviço.

Kaz - ★★☆☆
A segunda história é narrada por Kaz e eu tive um misto de sensações enquanto lia que só não foi pior do que minha impressão sobre Stevie. Mas não por causa de Kaz, que é super legal, mas por causa de Porsha que faz parte desse círculo de amigos e é a pessoa - e melhor amiga - que Kaz ama em segredo desde sabe-se lá quando, e faz qualquer coisa por ela. Quando Kaz, depois de muita coragem, finalmente decide que chegou a hora de revelar seus sentimentos, Porsha mostra o quanto é fútil. Ela é convidada pra uma grande festa de supostas subcelebridades e, num surto de emoção, arrasta Kaz pro shopping para que ele a ajude a comprar roupas e faz o coitado ficar a sua disposição, até que eles ficam presos por causa da nevasca. Eu juro que fiquei com dó de Kaz por ele gostar dessa menina porque, enquanto ele sempre está alí pra ela e por ela, Porsha não o trata muito bem, não demonstra nenhuma consideração ou interesse pela cultura e pelas tradições que ele segue, e não move um dedo pra acompanhar Kaz em nada que ele precise fazer. Não tenho dúvidas de que ele merecia alguém melhor.

E.R.  - ★★☆☆
Em seguida temos a história de E.R., Savana e Eric, que se passa no Aeroporto Internacional de Atlanta e explora um ciúme meio descabido que Savana sente da parceira (?). Evan-Rose é bissexual e aqui ela está se reencontrando com Savana, ou Van, a namorada/ex/namorada/sei lá exagerada e ciumenta, cujo relacionamento é meio estranho: elas só são namoradas enquanto Van vai pra Atlanta pra estudar, e nas férias de verão, quando ela volta pra casa em Maryland, elas ficam solteiras de novo, e como esse namoro (se é que podemos chamar assim) vai ficar bastante abalado quando E.R. recebe uma ligação de Eric, que ela conheceu durante o verão enquanto as duas estavam ~solteiras~, e que está preso no mesmo aeroporto que elas, e mesmo que o envolvimento deles tenha sido somente emocional e nada demais tenha rolado, alí estava a receita perfeita para o desastre, ou será que não?
Evan-Rose tem muita dificuldade em falar sobre o que sente e nem teve coragem de assumir sua sexualidade para sua família. A fixação dela por Savana é meio doentia, tanto que ela parece aceitar algumas situações nada a ver só pra não contrarir a dondoca, e ela parece não conseguir se impor quando precisa ser sincera ou dizer um simples não. Achei ela chata, achei a namorada dela mais chata ainda, e Eric é o único personagem que gostei no meio desse bolo. Não consegui enxergar nada de romântico nessa história, só vi uma pessoa mais desapegada que gosta de curtir (mas que parece estar em conflito com si mesma) e outra possessiva e aparecida que tornou a história tão bagunçada quanto estranha, até mesmo porque no meio dessa confusão existe a tarefa que deve ser feita pra ajudar Stevie mas que parece não se encaixar direito. Obs.: Tenho certeza que essa foi escrita por Nic Stone.

Sola - ★★☆☆
O capítulo 5 é narrado por Sola e, nele, o leitor vai conhecer como é a dinâmica familiar dela assim como os detalhes do que aconteceu quando Stevie foi até a sua casa e ocasionou o rompimento ente as duas. Esse capítulo mostra como a briga que levou ao término do namoro com Stevie começou e um pouco da personalidade de Sola, que apesar de ser mais romântica, é bastante exigente (o que leva o leitor a compeender o motivo do ultimato).

Jordyn - ★★
Depois conhecemos a história de Jordyn (ou Jordan) e Omari que, por um mal entendido ocorrido há um ano, mantém uma amizade meio estranha e cheia de alfinetadas. Omari está acompanhando Jordyn para uma apresentação de sua irmã - e melhor amiga de Sola - Jimi. Jimi pede para Jordyn aproveitar a viagem e levar alguns itens para ajudar Stevie nesse plano mirabolante, mas por causa da nevasca, o trânsito não move 1 centímetro e eles ficam presos dentro do carro. Alí, eles aproveitam pra resolver não só o mal entendido que houve entre eles mas, numa conversa mais profunda, tentam entender um pouco mais sobre as emoções de Jordyn com relação à sua mãe biológica que abandonou ela, as irmãs e o pai das meninas há quase 10 anos. Essa história, apesar de não se aprofundar tanto na vida dos personagens por ser curta, abordou de uma forma bastante satisfatória a química do casal e os conflitos emocionais de Jordyn com relação à mãe, e sua resistência às tentativas de aproximação dela (que remetem bastante a problemas de ansiedade). Ela tenta esconder seus sentimentos pra parecer forte, mas é inegável que ela fica abalada e tem uma necessidade enorme de resolver isso pra poder seguir em paz sem esse "peso". Penso que é a personagem com a carga dramática mais forte das histórias.
"... Não consigo imaginar como você se sente. Mas de uma coisa eu sei: às vezes as pessoas machucam quem amam, e isso diz mais sobre elas mesmas do que sobre o outro. Elas que são o problema. Dizem coisas que no fundo não querem dizer ou não dizem o suficiente. Elas podem não ter a intenção de machucar, mas só isso não basta quando os sentimentos de alguém estão em jogo. Ainda assim é preciso encontrar uma forma de consertar as coisas."

Jimi
 - ★★
O capítulo 8 tráz a história de Jimi (Jamila), melhor amiga de Sola e irmã do meio de Jordyn. Jimi é vocalista e guitarrista de uma banda chamada Rescuing Midnight, mas a banda está carregada de tensão e conflitos de interesses, pois Jimi odeia músicas românticas e os garotos que compõe o trio, Kennedy e Rakeem, acham isso uma completo absurdo e começam a evitá-la. Jimi está no Fox Theatre sozinha, sem saber se os garotos vão aparecer pra gravarem a música que poderia ajudar Stevie e Sola a voltarem, esperando Jordyn aparecer, e se sentindo culpada por ter causado esse climão, até que encontra Téo, um garoto com quem ela estudou no ensino fundamental e que agora é conhecido por seu nome artístico "Lil Kinsey". Depois que ele sumiu da escola sem dar notícias, ele se tornou um rapper bem famoso. E ele é o motivo de Jimi odiar músicas românticas...
Eu gostei bastante desse conto em particular pois ele fala muito sobre o sentimento de abandono, o que isso pode causar e como as pessoas lidam com isso, mesmo que rejeitem a afeição alheia como meio de defesa (se você não se envolve, então não se decepciona), pra tentarem seguir em frente. Embora o tema possa ser um gatilho pra várias pessoas, a forma como a autora aborda e desenvolve a história é bastante sensível pois Jimi e Téo acabam compartilhando memórias e se reconcetam através da música, o que é super legal.

Ava e Mason - ★★★ 
Esse conto em particular tráz os pontos de vista de Ava e Mason de forma alternada, onde, após se encontrarem no Aquário onde Ava tem um trabalho voluntário, relembram os motivos que os levaram a terminar o namoro. E em meio a essas lembranças, a maioria com desentendimentos bobos, eles começam a refletir sobre a "validade" dos relacionamentos quando precisam ir pra faculdade e eles vão se "separar". Acho que o conflito central dessa história é bastante realista pois trata de um dilema muito comum nos jovens que estão dando esse passo na vida (principalmente nos EUA onde eles saem de casa pra estudar e ficam longe por vários meses). Além disso, a história também aborda a ideia dos filhos seguirem por um caminho que não querem ou não gostam para superar as expectativas dos pais, e a forma como isso é exposto é tão sensível, ainda mais quando se tem apoio de quem se ama, que é impossível segurar as lágrimas.
Outro ponto bem bacana é o pano de fundo da história que remete a ciência e à vida marinha. A descrição da água azul, dos peixes nadando através do acrílico enquanto eles conversam e vão se entendendo é a coisa mais linda e perfeita de se acompanhar.
Tenho quase certeza que esse foi escrito pela Nicola Yoon e foi o único, assim como o conto dela em Blackout, que levou 5 estrelas e, de quebra, ainda me fez chorar, emocionada.

Uma coisa que não curti muito durante a leitura foram os nomes ou apelidos das personagens. A maioria deles é difícil de pronunciar pra quem não está acostumado, principalmente os nomes nigerianos que aparecem no capítulo de Sola, e acabaram travando a leitura a ponto de eu começar a pular os nomes ou só ler a primeira letra porque não tive paciência pra ir pesquisar a pronúncia de todos eles.
Acho que pelo livro ser das mesmas autoras que tem uma conexão muito boa pra escreverem juntas e, apesar de não ser uma série nem nada, ter o mesmo padrão de histórias curtas, a editora poderia ter mantido o título original em inglês. Acho que ficaria muito mais legal a combinação dos títulos "Blackout" e "Whiteout" do que "Blackout" e "Nevasca". Pelo menos com os nomes originais dá pra associar um com o outro fazendo esse contraste entre preto e branco relacionados ao escuro do apagão e ao branco da neve.
Um ponto curioso é que, embora no final do livro haja dicas, as autoras não informam nos capítulos quem escreveu o que alí.

Nevasca é um livro bastante agradável e vai, sim, dar aquele quentinho no coração, mesmo que algumas histórias sejam bem melhores que outras. Apesar de eu achar que as atitudes e pensamentos não condizem muito com as idades dos personagens, as histórias retratam as questões do amor juvenil, as descobertas, a amizade e os dilemas adolescentes, principalmente aqueles relacionados à orientação sexual e à ideia das histórias apresentarem personagens jovens, negros e com aspirações de vida bem bacanas de uma forma bem sensível e bonita.

O Demônio na Floresta - Leigh Bardugo

26 de agosto de 2023

Título:
O Demônio na Floresta: Uma graphic novel de Sombra e Ossos
Autora: Leigh Bardugo
Ilustrações: Dani Pendergast
Editora: Planeta/Minotauro
Gênero: Fantasia/Jovem Adulto/Graphic novel
Ano: 2023
Páginas: 208
Nota:★★★★★
Sinopse: Antes de Ravka ser liderada pelo Segundo Exército, antes da criação da Dobra das Sombras, e muito antes de ele se tornar o Darkling, havia um garotinho solitário oprimido pelo seu próprio poder extraordinário.
Eryk e sua mãe, Lena, passaram suas vidas inteiras fugindo. Mas eles nunca encontrarão o refúgio que tanto buscam. Eles não são somente Grishas – eles são os mais raros e perigosos desse grupo.
Temidos pelos que querem destruí-los e perseguidos pelos que desejam explorar seus dons, Eryk e Lena precisam mascarar suas habilidades a todo momento. Mas os segredos mais perigosos são os mais difíceis de esconder...

Resenha: O Demônio na Floresta é uma graphic novel que faz parte do GrishaVerso criado pela autora Leigh Bardugo. Ele antecede em muitos e muitos anos todos os acontecimentos que se passam na trilogia principal.

Nele vamos conhecer uma pequena passagem da vida de Aleksander Morozova, numa época em que ele era um jovem subestimado e oprimido pelo próprio poder, que só tinha Baghra, sua mãe, como companhia e a única em quem podia confiar. A história se passa antes de Ravka ser liderada pelo Segundo Exército, antes da criação da Dobra das Sombras, num período em que o mundo não era um lugar seguro para os Grishas, e antes dele se tornar o Darkling - o temido Conjurador das Sombras desse universo cheio de fantasia e muita ação.

Aleksander e sua mãe, que também é uma Conjuradora das Sombras, vivem fugindo de um lugar pra outro e mudando seus nomes para não serem encontrados por caçadores de bruxas, também chamados de drüskelle, que os perseguiam. Desta vez eles vão se passar por "Eryk" e "Lena" e, cansados de fugir, só queriam um lugar pra poderem permanecer por mais tempo sem levantar suspeitas. A próxima parada é um pequeno acampamento de Grishas que os acolhem e que, aparentemente, é seguro. O problema é que quanto mais tempo eles passam num local, mais vulneráveis ficam, consequentemente, mais perigoso é. O poder de Eryk precisa ser escondido até mesmo dos próprios Grishas, pois eles também poderiam se aproveitar desse poder para benefício próprio.











Não há muitos personagens e o formato da história limita um maior aprofundamento sobre eles, mas o pouco que há é suficiente pra conhecermos quem são, o que fazem e como suas personalidades e poderes os afetam. No acampamento, Eryk conhece as irmãs Annika e Sylvi. Annika é a irmã mais velha, uma jovem Hidro cujo poder não é forte o bastante, o que a deixa bastante frustada já que vive sendo diminuída pelo filho irritante do Ulle, o líder o acampamento. Sylvi é uma criança bastante curiosa, impulsiva e um tanto teimosa (e irritante), e seus poderes não se manifestaram, o que a deixa bastante inquieta e ansiosa. Logo ela se mete em situações perigosas e precisa da proteção da irmã a todo momento.
Lena é uma mulher forte e que se impõe para não ser subjugada por ninguém, mas ela se preocupa tanto com o filho que não mede esforços para fazer qualquer coisa que for preciso para protegê-lo. Qualquer coisa. Desde seus ensinamentos brutais até suas medidas extremas.

Quando os Grishas decidem que precisam caçar um Amplificador, um enorme Urso que andava pela floresta, as coisas começam a sair do controle e Eryk percebe que aqueles Grishas não são exatamente quem ele pensava que fossem. Essas situações vividas por ele acabam por moldá-lo para que, no futuro, ele se torne o Darkling que conhecemos. O pouco que acontece na história mostra que Eryk, até então, tem boas intenções mas, ao que parece, a maldade e a ganância daqueles que cruzaram seu caminho acabaram por fazer com que ele deixasse de acreditar que poderia confiar em alguém. Assim, sem ter mais recortes de sua vida, fica difícil afirmar se ele é mesmo esse vilão tão terrível, ou se era um herói incompreendido que se permitiu ser corrompido a medida que se decepcionava cada vez mais.


As ilustrações feitas por Dani Pendergast são maravilhosas e trazem uma paleta de cores que misturam cores frias e quentes de uma forma super agradável e bonita de se ver. Os personagens são expressivos e as cenas são retratatas com a devida intensidade para que as imagens possam valer mais do que as palavras. Os balões de pensamento de Eric em forma de sombras foram uma sacada genial e que representam bem seu interior.

O único ponto negativo do livro é que a história é curtinha e ele acaba rápido demais. É impossível não ficarmos curiosos com mais detalhes da vida de Aleksander e como ele passou a lidar com seu poder até se tornar o Darkling.
Pra quem gosta da saga e quer ter mais detalhes sobre esse vilão que amamos odiar (ou talvez odiamos amar), é leitura super indicada e espero que a autora continue investindo nesse formato de graphic novel para se aprofundar e trazer mais detalhes do que aconteceu até o auge do Darkling.

Este Inverno: Uma novela de Heartstopper - Alice Oseman

21 de agosto de 2023

Título:
Este Inverno: Uma novela de Heartstopper
Autora: Alice Oseman
Editora: Seguinte
Gênero: Jovem Adulto/Romance
Ano: 2023
Páginas: 112
Nota:★★★★★
Sinopse: Tori, Charlie e Oliver Spring sabem que o Natal deste ano vai ser diferente. Depois de passar um período internado para tratar seu transtorno alimentar, tudo o que Charlie quer é não ser o centro das atenções ― o que parece impossível.
Quando as coisas saem do controle, cada um dos irmãos vai ter que encontrar um jeito de lidar com este inverno difícil ― e buscar conforto um no outro.

Resenha: Este Inverno é uma novela do universo Hearstopper que se passa durante os acontecimentos do vol. 4, De Mãos Dadas, quando Charlie volta pra casa depois de precisar ficar internado para tratar de seu transtorno alimentar. Mas, por ser véspera de Natal, a família inteira se reúne na casa dos Springs e nada poderia ser pior do que aquela torta de climão, seja pelos parentes (que só aparecem uma vez na vida e outra na morte) querendo saber detalhes da orientação sexual de Charlie, ou por acharem que ele é algum maluco por ter passado algumas semanas num "hospício" sem sequer se preocuparem de fato com o que aconteceu com ele e como ele chegou a esse ponto. Charlie só queria poder ficar em paz, e por mais que ele tente ser discreto e passar despercebido no meio desse povo, é impossível manter o controle quando ele vira o centro das atenções.

O livro é dividido em três capítulos, todos narrados em primeira pessoa, cada um dedicado ao ponto de vista dos irmãos Spring. O primeiro capítulo é narrado por Tori, como ela enxerga a situação e como é a única dessa família desajustada que não trata Charlie como se ele fosse uma aberração.
Apesar dela ser um tanto fechada e não fale muito, dá pra perceber o quanto ela ama os irmãos, se preocupa e é compreensiva, desde a paciência infinita com as peripécias de Oliver, até como ela tenta ajudar Charlie a se sentir acolhido o tratando como igual, embora ele não lhe dê muito espaço pra isso e às vezes até desconta nela suas frustrações. Vemos o quanto é desconfortável e difícil pra Charlie aturar parentes intrometidos e sem noção nenhuma, e até com seus pais que não demonstram nenhuma empatia ao lidar com os problemas do filho. Tori, além de entender como deve ser doloroso pro irmão comemorar um feriado cheio de comida quando o problema dele é com comida, percebe o quanto Charlie sofre com tudo isso, se sente tão incomodada quanto ele, mas não pode fazer muita coisa por achar que não tem direito de ultrapassar os limites e invadir seu espaço. Mas ela percebe como ninguém que o que seus pais fazem para ajudar Charlie está longe de ser suficiente.


"Odeio como as pessoas reagem quando descobrem que Charlie passou algumas semanas internado. Como se fosse a cposa mais horrível que já ouviram. É porque elas associam automaticamente a manicômio e gente louca em vez de tratamento e recuperação e aprender a lidar com um transtorno alimentar."
O segundo capítulo é narrado por Charlie e acompanhar como ele se sente é bastante complicado e talvez cause vários gatilhos relacionados a saúde mental. Ele sabe que, diferente dos seus pais, Tori se importa, mas reconhece que às vezes é duro com ela quando não deveria ser. Através dessa narrativa de Charlie e seus diálogos com Nick, o leitor entende melhor seus conflitos psicológicos, os problemas em família que ele enfrenta, a dificuldade em ter uma conversa mais aberta com os pais e o quanto ele se sente culpado por não corresponder às expectativas deles, como se fosse um fardo. Da mesma forma ele também sabe o quanto as semanas que ele passou internado foram importantes para que ele pudesse receber a ajuda necessária para entender melhor seu transtorno e poder lidar com eles agora que sabe a origem desses problemas. Mas claro, não é fácil, é um processo a longo prazo, e Charlie sente que Nick é o único disposto a passar por tudo isso junto com ele. Quando Charlie larga a família e o bando de parentes imprestáveis em pleno Natal pra evitar brigas e vai pra casa de Nick, a gente percebe a discrepância gigantesca do tratamento de uma família em relação a outra (com exceção de David, irmão de Nick, que é uma criatura ridícula, ignorante e desprovida de bom senso e inteligência). Charlie encontra na família de Nick todo o acolhimento e respeito que sua própria família nunca lhe deu. E isso dói e até causa revolta, pois os pais dele não são capazes de perceber sua parcela de responsabilidade nesse problema e preferem focar na ideia de que eles "fazem o que podem pra esse filho ingrato" como se isso tivesse a ver com eles, e não com Charlie.



Pra finalizar, o terceiro capítulo é narrado por Oliver, o irmãozinho mais novo de sete anos. Ele mostra, pelo seu ponto de vista, o que está acontecendo naquele Natal falido de uma forma bastante infantil e engraçadinha. Mas apesar de ser bem bonitinho a preocupação que ele demonstra ter com o sumiço do irmão, e depois da irmã, ou como fica triste por estar jogando video game sem companhia no meio daqueles parentes chatos, não fiquei convencida de que era uma criança falando devido a forma como ele percebe e expõe as coisas. Mas talvez isso seja só um detalhe que eu tenha percebido por ser mãe e saber como meus filhos costumam se expressar.

Assim como os outros volumes, as ilustrações seguem o mesmo padrão bonitinho de traço (mesmo que nas novelas os desenhos sejam em preto e branco), os personagens são bastante expressivos e a diagramação, que combina a narrativa com ilustrações e simulação de troca de mensagens no celular, é super caprichada.

Apesar de achar que uma série acaba ficando muito saturada quando tem vários livros extras que poderiam ser inseridos nos livros principais, confesso que Este Inverno, apesar de triste, é uma história bem especial e que foi um bom acréscimo que aborda o tema da dinâmica familiar problemática e da saúde mental de um jeito bem leve e respeitoso. Pra quem gosta do universo Hearstopper e quer matar um pouco da saudade dos personagens enquanto o vol.5 não vem, recomendo.

Mil Batidas do Coração - Kiera Cass

15 de agosto de 2023

Título:
Mil Batidas do Coração
Autora: Kiera Cass
Editora: Seguinte
Gênero: Jovem Adulto/Romance
Ano: 2023
Páginas: 496
Nota:★★☆☆☆
Sinopse: Annika sempre viveu rodeada pelos confortos da realeza, mas nenhum luxo é capaz de mudar o fato de que ela não pode tomar decisões sobre a própria vida. Afinal, depois que o rei, seu pai, perdeu a esposa, ele se tornou um homem calculista, insistindo para que Annika aceite um casamento arranjado. O amor, para ela, virou uma questão política.
Enquanto isso, longe dali, qualquer mínimo conforto é um milagre na vida de Lennox. O jovem dedica sua vida ao exército de seu povo na esperança de um dia retomar o trono que foi roubado deles e vingar a morte do pai. Para Lennox, o amor não passa de uma indesejada distração na sua luta por justiça.
Mas quando o destino desses jovens inimigos se cruza de maneira inesperada, despertando um amor imprevisível, será que eles serão capazes de resistir a esse sentimento em nome de seus reinos? Ou vão se entregar ao som de mil batidas do coração?

Resenha: Annika é a princesa do reino de Kadier, um lugar governado por um rei que, após a perda de sua esposa, se tornou frio e calculista. Annika é cercada por todo o luxo que a realeza pode proporcionar, mas ela não é livre nem para escolher a roupa que vai usar e, agora, precisa se casar com o primo, na intenção de fortalecer o reino e manter o poder. Para Annika, o amor se tornou algo arranjado e que não passa de uma questão política.

Longe dali, numa terra esquecida e inóspita, Lennox é um soldado que dedica sua vida ao exército e à resistência e é bastante temido por sempre fazer o serviço sujo que ninguém mais tem coragem de fazer. Seu objetivo é recuperar o trono que ele acredita pertencer ao seu povo e vingar a morte de seu pai, e para isso ele não medirá esforços e irá se empenhar ao máximo possível. Para Lennox, relacionamentos e apegos emocionais são meras distrações quando o assunto é lutar por justiça.

Até que Annika é sequestrada por soldados liderados por Lennox, pois o reino roubado em questão é Kadier. O que ninguém esperava era que a princesa e o soldado iriam se encontrar diante de um enorme dilema devido a esse sentimento imprevisível e perceberiam que o que está em jogo vai além desse relacionamento proibido. Os dois entenderão que a verdade pode ser distorcida e que nem tudo o que eles foram levados a acreditar durante muitos anos condiz com a realidade.

O livro é narrado em primeira pessoa, com capítulos que se alternam entre os pontos de vista de Annika e Lennox. Eu costumo gostar de livros que trazem esse tipo de narrativa, desde que seja possível diferenciar os personagens por terem "vozes" diferentes, o que não acontece aqui. Se não fosse pelo nome do personagem iniciando o capítulo, eu nem saberia quem estava narrando, pois parecem a mesma pessoa. Senti que faltou algo para diferenciar o ponto de vista dos dois.

Confesso que a primeira metade do livro é arrastada e levou uma eternidade para prender minha atenção; levei meses para terminar a leitura e li e reli os primeiros capítulos várias vezes. O ritmo melhora na segunda metade e as coisas se tornam mais fluídas e menos confusas, mas não nego que muita coisa acontece de forma bastante conveniente para criar situações ou justificar certas atitudes. O problema é que a história passa a ser corrida demais, e com acontecimentos bem difíceis de engolir.

Tanto Annika quanto Lennox passam por problemas familiares bem delicados, pois as figuras paternas que eles têm são as mais disfuncionais e falhas que podem existir; eles só não enxergaram isso ainda. A trama traz aquele romance "enemies to lovers" bastante clichê, mas, além de não ter química nenhuma, me incomodou bastante a ideia dos protagonistas - aparentemente rivais - se apaixonarem de forma instantânea e com profundidade zero. Eles são totalmente o oposto um do outro, mas se assemelham bastante quando o assunto é se submeterem e serem obedientes a quem representa a autoridade; no caso de Annika é seu pai, o rei, e no caso de Lennox é Kawan, o companheiro de sua mãe e líder de seu povo.

Apesar de Annika ter a personalidade forte e com aquele toque de dama rebelde, ela sempre pensa no bem-estar das pessoas do reino (que nunca aparecem em lugar nenhum); tanto que está pronta para se casar com alguém que ela nem conhece direito, por determinação do pai, acreditando que isso é o melhor para Kadier, mas toda essa benevolência não parecia ter um padrão muito realista e plausível para mim.
Lennox tem que lidar com a tirania de Kawan, mas com o objetivo de assumir o controle das terras que ele acredita terem sido roubadas, ele está pronto para qualquer coisa, mesmo que isso signifique tirar a vida de quem cruzar seu caminho. Claro que, por trás de toda essa frieza, ele esconde um cara compreensivo e gentil que vai conquistar a mocinha na primeira troca de olhares. No entanto, quando um personagem é apresentado como assassino cruel, fica meio difícil acreditar que ele tenha esse lado mais humano e sensível. A autora tenta dificultar as coisas fazendo com que eles demonstrem se odiar enquanto tentam lutar contra os próprios sentimentos à medida que vão se conhecendo cada vez mais, mas eu já estava revirando os olhos, porque nada daquilo parecia real ou aceitável para mim.

Diferente dos outros livros da autora, a construção de mundo e as questões políticas foram abordadas de forma bastante rasas, e as resoluções dos problemas foram fáceis, o que deixou a desejar. O livro tem quase 500 páginas, mas parece que nenhuma delas foi dedicada à construção do mundo; tudo parecia muito vazio e sem vida. Logo, não consegui dar a devida importância ou entender a motivação feroz de Lennox para recuperar um reino genérico que não tem nada de especial. O final acabou sendo previsível e fraco. Os personagens secundários também não salvam a história, porque as coisas entre eles também aparecem de repente e sem muitas explicações. Além disso, eles têm algumas atitudes questionáveis que parecem estar ali só para despertar nossa antipatia, enquanto outros estão ali só para criar um certo apego, até que eles morram, com a intenção de deixar o leitor triste. Mesmo que alguns deles tenham algum destaque, eles não demonstram tanta importância assim.

Apesar do romance nada realista e da demora para a história engatar e começar a se tornar um pouco menos enrolada, o livro tem alguns pontos positivos, como reviravoltas e revelações interessantes. No entanto, talvez funcione melhor para um público menos exigente com relação à construção de mundo e detalhes. Para quem foi fã de Kiera Cass e amou a trilogia A Seleção, eu esperava algo mais empolgante e que me mantivesse interessada. Infelizmente, isso não aconteceu com Mil Batidas do Coração, e acho que a história podia ser contada da mesma forma com umas 200 páginas a menos. Talvez eu já tenha deixado de ser o público-alvo dela há anos, e só agora estou me dando conta disso, o que é uma pena...

Enquanto Eu Não te Encontro - Pedro Rhuas (Audiolivro)

13 de março de 2023

Título:
Enquanto Eu Não te Encontro (Audiolivro)
Autor: Pedro Rhuas
Narração: Pedro Rhuas
Editora: Seguinte
Gênero: Jovem Adulto/Romance
Ano: 2021
Duração: 7h 43min (272 páginas)
Nota:★☆☆☆☆
Sinopse: Nenhum encontro é por acaso.
A vida tem sido boa para Lucas. Ele passou no Enem para estudar publicidade; se mudou com Eric, seu melhor amigo, do interior do Rio Grande do Norte para a capital; e conseguiu sua tão aguardada liberdade. Mas, no amor, Lucas é um desastre. O maior fã de Katy Perry no Nordeste tem certeza de que nem toda a sorte do mundo poderia fazer com que ele finalmente se apaixonasse pela primeira vez.
Até que, em uma despretensiosa noite de sábado em 2015, tudo muda. Quando Lucas e Eric vão na inauguração do Titanic, a mais nova balada da cidade, Lucas esbarra (literalmente!) em Pierre, um lindo garoto francês que parece ter saído dos seus sonhos. Em meio a drinques, segredos e sonhos partilhados, Lucas e Pierre se conectam instantaneamente. Eles vivem o encontro mais especial de suas vidas, mas o Universo tem outros planos para o futuro... Até a noite acabar, o que será que vai acontecer com eles?
Com uma voz original e divertida, repleta de referências pop e à cultura do Rio Grande do Norte, o livro de estreia de Pedro Rhuas vai te fazer rir alto e se apaixonar.

Resenha: Em busca de sua liberdade, Lucas, um jovem de 20 anos que estuda publicidade e o maior fã de Katy Perry que existe, decidiu sair da cidadezinha de Luna do Norte pra ir morar em Natal, no Rio Grande do Norte, junto com o melhor amigo de infância, Eric. Os dois estão na faculdade, dividem um apartamento aconchegante e têm uma amizade super legal e sincera, até Eric arrumar um namorado da noite pro dia, o Raul, e deixar Lucas de lado com a sensação de ter sido abandonado. Quando o assunto é relacionamento, Lucas se considera um desastre e parece ter perdido as esperanças de encontrar alguém.
Mas tudo muda quando chega o dia da inauguração da balada mais top da cidade, o Titanic. Lucas, Eric e Raul saem pra curtir a tão esperada noite, e Lucas conhece Pierre, um francês que parece ter saído de um sonho mais lindo que eu já vi. Talvez o universo e o destino reservam algo de especial para Lucas, nem que seja pelo menos até o fim da noite...

Já ouvi vários audiolivros nessa minha vida de leitora, desde os narrados por narradores profissionais, os narrados por amadores e leitores comuns, e até os por narração sintética no Youtube, mas essa foi a primeira experiência com um audiolivro narrado pelo próprio autor que tive. Já adianto que não curti e que eu poderia escrever uma resenha enorme falando sobre todos os pontos que não gostei nesse livro, e é isso mesmo que vou fazer pra tentar mostrar meu ponto sobre não entender e nem concordar com esse hype todo.

Eu levaria no máximo 3 horas pra finalizar um livro de 270 páginas dando várias pausas, mas alongar essa leitura numa narração de quase 8 horas foi difícil, principalmente porque o tom da narração muitas vezes não combinava com o ambiente ou com a situação e ficava super forçada e exagerada, e chegou num ponto onde eu larguei o audiolivro por falta de paciência, e 2 meses depois que é tive coragem de retomar.
O audiolivro tem a trilha sonora embutida (composta pelo autor e disponível no Spotify), e acho até legal essa iniciativa de escrever um livro e criar toda uma ambientação em volta da história pra se criar aquela experiência completa e imersiva para o leitor aproveitar, mas pra mim não funcionou, deixou tudo mais cansativo, me distraía, e não caiu no meu gosto pessoal.

A história se passa em 2015 e é dividida em Primeiro Encontro, Desencontro e Segundo Encontro e cada parte tem os próprios capítulos bem curtinhos com títulos chamativos sobre as várias situações que estão dentro desses acontecimentos, mas em vez de eu me deparar com uma história sobre primeiro amor, representatividade e cultura nordestina como eu esperava, a única coisa que ficou evidente, com pouquíssimas ressalvas, foi a insistência em falar de memes ultrapassados, o lacre, soltar frases motivacionais ou de efeito aleatórias em meio à divagações, militância, questões políticas inseridas fora de contexto, mais lacre, e fazer referências a todos os ícones da cultura pop do mundo em meio a diálogos ruins e nada naturais. No primeiro capítulo já encontramos menções à Lady Gaga, Katy Perry, Os Simpsons, The Sims, Grey's Anatomy e o Gato de Botas, e a enxurrada de referências continua sem parar ao longo da história. Senti como se o autor quisesse mostrar todas as coisas legais e bafônicas que ele conhece e decidiu espalhar pelo livro porque sim, a ponto de eu ficar confusa e sem saber se ele falava dos interesses do personagem ou de si mesmo. Na maioria das vezes eu sentia que estava perdida na sessão de comentários de algum portal de fofoca qualquer, ou numa trend ruim sobre celebridades no Twitter. Há também a quebra da quarta parede onde o protagonista faz comentários sobre alguma situação ou fala descrita, e confesso que esse recurso num livro não me agrada muito, principalmente quando não consigo me conectar com o personagem. O tempo perdido com toda essa encheção de linguiça ou meras pinceladas sobre temas importantes poderia ser investido em construir e desenvolver melhor os personagens, tornar as coisas mais plausíveis, e quem sabe assim a história não ficasse a cara das fanfics de qualidade questionável do Wattpad.

Como o primeiro encontro desses dois acontece nessa boate Titanic, que inclusive serve de metáfora pra algumas situações descritas, fiquei imaginando aquela ambientação de balada top, muvuca, gente dançando e bebendo, música alta, glitter voando pra todo lado, então pra mim, por mais que eles pudessem estar um pouco mais afastados da bagunça no tal "convés", não fazia sentido Lucas e Pierre conseguirem conversar e se abrirem um pro outro durante 3 horas de uma forma tão profunda como eles fizeram, como se estivessem em total privacidade numa praia deserta, no silêncio e tranquilos, só esperando o nascer do sol. Não consegui acreditar que aquela conversa, naquele tom, durante esse tempo estava acontecendo naquele lugar.

Alguns personagens que pareciam ter um potencial grande de serem interessantes na história, como o casal de garotas de cabelo colorido ou a drag queen jovem mística e escandalosa, só estão alí pra se aparecer mesmo, e depois nunca mais ouvi falar. Se a ideia era criar um leque de personagens LGBTQIAP+ em prol da representatividade, não acho que funcionou quando o foco ficou somente em descrever Lucas, seus faniquitos, suas gírias e palavreados, e o surto por ter conhecido seu príncipe. Eu juro que achei o máximo o autor trazer um protagonista com essa característica afeminada porque é difícil encontramos personagens assim na literatura, mas ele é chato e tudo parece plástico, de tão artificial. E Pierre é tão perfeito, maravilhoso e sem nenhum defeito que deixa qualquer príncipe encantado da Disney recolhido à própria insignificância.

Algumas lembranças de infância ou situações difíceis que Lucas e Eric viveram, e como eles se uniram pra passar por isso, talvez tenham sido a única e melhor mensagem do livro, como a descoberta de sua sexualidade e a preferência pelas "coisas de menina", a decepção e o estado de negação da família por saber que o filho é gay, o bulliyng sofrido na escola por outras crianças maldosas, a pressão sobre eles por uma expectativa criada que não pode ser superada e afins, e até a rápida tentativa de se relacionar com meninas pra se certificar de que não existe "nada de errado" com eles, e tenho certeza que muitas pessoas que tiveram uma experiência parecida puderam se identificar com esse padrão de acontecimentos até poderem assumir a própria sexualidade e, infelizmente, alguns sequer conseguem fazer isso. O próprio Eric passou muito tempo dentro do armário e só agora está se permitindo ser feliz, sendo quem é. Penso que o #orgulho é um dos movimentos mais importantes e necessários que existem, pois em meio a tanta luta, ele também é capaz de simbolizar a vitória que é conseguir passar por tudo isso sem se perder, e seguir em frente de cabeça erguida, ainda que todas essas experiências deixem marcas que talvez nunca poderão ser apagadas. E tenho que ser sincera em dizer que o autor acertou pelo menos nessa abordagem, pois Lucas, apesar de ser insuportável, é muito sincero quando descreve como aconteceu, o que sentiu e como lidou com isso. Foi a única coisa que senti ser realmente real.
"Fiz uma promessa que, se um dia contasse a minha história, gritaria logo nas primeiras páginas sobre o viado orgulhoso e nordestino que sou."
Infelizmente nem essa questão que mencionei acima, nem os textões disfarçados de diálogos e pensamentos filosóficos foram capazes de salvar a história, porque parecem palestras de coachs de internet tentando vender curso. Talvez se isso fosse integrado à história de outra forma pra fluir de um jeito mais natural, onde o autor quisesse causar a reflexão com base nas experiências dos personagens em vez de querer ensinar alguma coisa com essas lições prontas, funcionaria melhor. Separei um trecho de uma cena onde Lucas cai no chão que deve explicar o que quero dizer sobre o exagero e como esse tipo de coisa é inserida de qualquer jeito, em qualquer brecha, do nada:
"Na hora, nem percebo que meus joelhos ficam ralados. Minha maior preocupação é manter o celular intacto. E não me envergonho disso, tá? É um comportamento absolutamente aceitável quando nos enxergamos como meros produtos de uma sociedade regida pelo capitalismo brutal, onde as elites controlam os meios de produção e, pros pobres coitados como você e eu, resta a eterna desventura de tentar preservar os bens de consumo adquiridos com tanto esforço."
Por mais que a informação acima seja um fato, não vejo como isso cabe nessa história. Se eu quisesse ler sobre o capitalismo e como ele é o maior vilão da sociedade, o último lugar que eu ia procurar informações sobre seria num livro jovem adulto com romance de conto de fadas gay. É meio desanimador pegar um livro esperando ler uma história divertida, achar que vamos dar um rolê pelo nordeste afora, e ter que ficar se deparando com esses discursos gratuitos a todo momento vindo de um personagem que só tem como característica marcante ser gay, dar chilique e ficar militando sem parar. Lucas, meu filho, descansa.

Talvez eu apenas não seja o público alvo desse tipo de história pra simplesmente ignorar todos esses pontos como se não fossem problemáticos pra mim, e acho que outros leitores mais jovens e que se identifiquem mais tirem um maior proveito, então nada melhor do que ler e tirar as próprias conclusões. Os fãs que me perdoem, mas o problema maior foi a necessidade de eu ter que espremer a história até conseguir extrair alguma mínima coisa que fosse boa, e quando chega ao ponto do leitor precisar fazer todo esse esforço, acho que a coisa já desandou e não vale a pena.

Eu Beijei Shara Wheeler - Casey McQuiston

15 de dezembro de 2022

Título:
Eu Beijei Shara Wheeler
Autora: Casey McQuiston
Editora: Seguinte
Gênero: Jovem adulto/Romance
Ano: 2022
Páginas: 352
Nota:★★★★☆
Sinopse: Chloe Green está a um passo de terminar o ensino médio e deixar False Beach, a cidadezinha ultraconservadora onde vive, para trás. Mas, antes disso, ela tem um último objetivo a cumprir: ser eleita a melhor aluna do colégio e a oradora da turma. Seu único obstáculo? Shara Wheeler, a garota mais popular da cidade, que arranca suspiros por onde passa.
Só que, faltando pouco mais de um mês para a formatura, Shara simplesmente desaparece. Todos são pegos de surpresa, mas Chloe tem um motivo a mais para ficar chocada: um dia antes, Shara a tinha beijado na boca sem maiores explicações.
Decidida a encontrá-la para tirar a história a limpo, Chloe logo se vê em uma busca bastante inusitada: Shara espalhou vários cartões pela cidade, dando pistas sobre o seu paradeiro e revelando uma personalidade até então desconhecida ― e que pode mudar completamente os planos de Chloe.

Resenha: Faz quatro anos que Chloe e suas mães saíram do sul da Califórnia para irem viver em False Beach, Alabama, uma cidadezinha ultraconservadora que não aceita muito bem nada que foge do tradicional. Agora, Chloe não vê a hora de se formar no ensino médio e dar no pé rumo a faculdade. Frequentar a Escola Cristã Willowgroove, uma escola conservadora, ainda mais dada sua composição familiar, não é nada fácil, mas o que mais preocupa e desperta o espírito de competição em Chloe, é a rivalidade entre ela e Shara Wheeler, a it-girl da escola e garota mais popular da cidade. Chloe está muito perto de vencer Shara se tornando a oradora da turma e terminar o ano com chave de ouro, mas faltando pouco mais de um mês pra formatura, Shara simplesmente desaparece. Como se isso já não fosse suspeito o bastante, Shara ainda lascou um beijo em Chloe sem maiores explicações antes de sumir no mundo, deixando a garota a beira de um ataque de nervos, chocada.

Depois de descobrir que Shara também beijou Rory, o vizinho, Chloe se junta a ele e invadem a casa da desaparecida em busca de pistas, e após isso eles tem a ideia de procurar o namorado de Shara para tentar decifrar as cartas que receberam. A partir daí, os três se juntam para formar uma aliança improvável numa tentativa de descobrir mais pistas sobre o paradeiro de Shara e solucionar esse verdadeiro mistério, e pra isso eles vão sair por aí invadindo todos os lugares possíveis e inesperados em busca de qualquer informação. Até que Chloe começa a perceber que Shara, através de pequenos detalhes encontrados, é bem diferente e parece ter mais camadas do que ela pensou, e que talvez ela devesse dar uma chance pra si mesma de permanecer em False Beach.

Narrado em terceira pessoa, os capítulos são curtos e bem fluídos, bem no estilo divertido, queer, atraente e emocionante da autora. Os capítulos vem em forma de uma contagem, mostrando quantos dias Shara está sumida e quantos dias faltam para a formatura.
Quem gosta da autora e acompanha seus livros já deve ter percebido que a construção dos personagens é a alma do negócio. São todos adoráveis, humanos, às vezes irritantes, e longes da perfeição. Mesmo que muito jovens, eles possuem camadas, são complexos em suas individualidades mas muito interessantes, cada um a sua maneira. Acompanhar o desenvolvimento da amizade, até então inimaginável, entre Chloe, Rory e Smith foi muito satisfatório, principalmente quando se trata de adolescentes que aprendem alguma coisa de útil com a experiência e demonstram inteligência. Chloe é sarcástica e as piadinhas em meio aos diálogos não abrem nenhuma brecha pra qualquer tédio durante a leitura, e achei que o bom humor ajudou bastante a trazer uma leveza para a trama de uma forma bem natural, mesmo quando alguns temas mais delicados, como racismo, homofibia e fanatismo religioso, eram abordados. A questão da cidade e a própria escola serem conservadoras acabam pesando nesses temas, pois vemos a influência da religião na educação e na maneira como os moradores se enxergam, logo também entramos na questão da criação da pessoa. A autora tem um cuidado muito grande em abordar o que a religião significa para os demais personagens que não são cristãos ou conservadores sem passar a ideia de que tudo é errado, ou de que tudo é preconceito, como se só existisse um lado da história, e isso acaba fazendo o leitor refletir sobre julgamentos. Há uma quantidade significativa de personagens queer, onde muito deles estavam em diferentes estágios de descoberta ou jornada sobre quem são e onde querem chegar dentro da comunidade.

Os momentos que a autora promove entre os amigos são engraçados, são sensíveis, há partes onde um apoia o outros em situações bem difíceis, e é impossível não torcer por eles a medida que eles vão sendo mais explorados e trazendo à tona as características de suas identidades e personalidades.

Confesso que Chloe não é uma personagem muito fácil de lidar, porque em alguns pontos a obsessão dela por Shara chega a ser meio esquisita e, às vezes, ela parece se achar superior aos outros por ter vindo da Califórnia a ponto de eu ficar a fim de dar um sacode nela. Outra coisa que me incomodou um pouco foi a questão da busca pelas pistas, que começa muito legal, mas vai chegando num ponto que se torna meio cansativa.

No mais, é um livro excelente sobre ser adolescente em processo de amadurecimento e descobertas num momento de incertezas e dilemas, em meio a sentimentos conflitantes que vão se desencadeando a partir de novas experiências. É uma história sensível e emocionante sobre ser você mesmo, sobre ir atrás do que se quer, e, inesperadamente, encontrar no meio do caminho.

Destruidor de Espadas - Victoria Aveyard

14 de dezembro de 2022

Título:
Destruidor de Espadas - Realm Breaker #2
Autora: Victoria Aveyard
Editora: Seguinte
Gênero: Alta Fantasia/Jovem Adulto
Ano: 2022
Páginas: 560
Nota:★★★★☆
Sinopse: No segundo volume dessa fantasia épica viciante, Corayne chega mais perto de se tornar uma heroína ― mas uma nova ameaça está à espreita.
Corayne não imaginava o que vinha pela frente quando um imortal e uma assassina bateram à sua porta. Eles anunciaram que ela era a única capaz de deter Taristan, um homem sedento por poder que estava abrindo portais para outros mundos, lares de criaturas aterrorizantes. Desesperada por uma aventura, ela partiu determinada a cumprir essa missão, com a ajuda de uma espada especial e de um grupo improvável de aliados.
Depois de uma batalha que quase lhes custou a vida, Corayne e os Companheiros conseguiram fechar um dos portais. Mas eles sabem que essa guerra está longe de acabar… Afinal, Taristan avança ao lado da rainha Erida, conquistando mais e mais territórios pelo caminho.
Quando percebem que o cerco está se fechando, resta aos Companheiros formar seu próprio exército. Num esforço de unir reinos há muito tempo divididos, eles vão enfrentar assassinos ardilosos, feras terríveis e mares tempestuosos. Tudo isso enquanto descobrem da pior forma que Taristan libertou um perigo ancestral, capaz de colocar em risco até a vida dos guerreiros mais poderosos.

Resenha: Destruidor de Espadas, de Victoria Aveyard, é o segundo volume da trilogia Realm Breaker que dá continuidade aos acontecimentos de Destruidor de Mundos.

Essa resenha pode ter spoilers do primeiro livro.

Depois de vários portais que dão acesso a outros mundos perigosos terem sido abertos pelo rei Taristan para espalhar o caos, Corayne, portando a espada que pertenceu a seu pai, conseguiu fechar um dos Fusos por ser a única capaz de realizar tal feito. O Fuzo que fora fechado deixa de ser uma ameaça, mas há outros espalhados que precisam ser fechados também. Assim, Corayne e a guilda de heróis composta por Sorasa, Andry, Dom, Valtik, Sigil e Charlie, que passou a ser chamada de "Os Companheiros", precisam correr contra o tempo para impedir que o pior aconteça, o problema é que eles não precisam lidar apenas com as ambições e os planos terríveis de Taristan, mas também com a rainha Erida. Ela quer se tornar imperatriz de Todala e que todos se curvem aos seus pés, mesmo que pra isso ela precise derramar sangue de inocentes e o povo que lute.

Levando em consideração a escrita do primeiro livro e dos outros livros da autora, eu já esperava que esse seguiria o mesmo padrão, mas confesso que fiquei exausta com a leitura deste. Capítulos gigantescos, arrastados e intermináveis, com descrições minuciosas pra cada grão de poeira que aparece e que poderiam ser retiradas sem afetar a história tornando a leitura muito mais fluída e rápida, economizando pelo menos metade das páginas. Admito que talvez ela compense essa enrolação com cenas de ação e aventura bem emocionantes, mas não achei que o equilíbrio foi justo. Também fiquei com aquela sensação meio amarga de que a autora cria aquela tensão em uma situação desesperadora ou que envolva algum romance para ficarmos na expectativa mas nada de terrível acontece, então num certo ponto, quando aparece outra cena desesperadora, já não há mais espaço pra preocupações, pois já sabemos que não passa de mais um susto e que daqui a pouco passa. A reviravolta é legal, mas é previsível. A tensão "amorosa" (entre aspas mesmo, porque aquilo tá mais pra alguma doença) entre Taristan e Erida é sofrível, e o tempo que a autora enrola pra eles darem um beijo chega a dar vontade de desistir.
Outra coisa que não me desce de jeito nenhum é a forma como Taristan é um vilão caricato e genérico, e as motivações que ele tem pra atingir seus objetivos são ridículas. E tenho que ser sincera em dizer que odiei com todas as minhas forças a tirania de Erida e como foi forçada a ideia dela ser odiada pelos nobres só por ser mulher. Ah, vá... Ela é odiada porque é uma maníaca que sai despejando atrocidades por onde passa, mas ainda assim não consegui engolir essa figura de rainha má que ela faz tanta questão de mostrar pros outros porque me soou tudo muito gratuito, e a ideia dela ter uma dependência emocional do rei também não combina muito bem com essa opressão que ela sai espalhando e com a liberdade que ela sempre afirma ter.

O ponto alto pra mim, assim como no primeiro volume, foi a construção das relações entre os personagens. Os Companheiros, mesmo que em maioria sejam super estereotipados dentro de suas funções, são leais uns aos outros e se tornaram uma verdadeira família, e os momentos que eles passam juntos, seja enfrentando perigos e passando por provações, ou em momentos de pequenas descontrações e descanso, é muito legal de acompanhar, principalmente pelos diálogos bem humorados e inteligentes.
Há um contraste bem interessante entre os relacionamentos entre Corayne e Andry, e Sorasa e Dom, mas sem partir para o romance descarado e meloso. Enquanto o primeiro mostra o papel da juventude e como eles terão as vidas marcadas numa guerra enquanto mantém a esperança de que tudo vai dar certo no final, o segundo foca no peso das escolhas que são feitas a partir de uma vasta experiência de vida, logo há esse equilíbrio em vez de só focar num drama adolescente que ninguém aguenta mais, e muitas cenas são bem sensíveis e emocionantes. As coisas são bem sutis pois o que está em jogo é a vida das pessoas, e o romance eles resolvem depois. Prioridades... O que acho o máximo é que por mais que Dom e Sorasa vivam brigando, no fundo a gente sabe que eles se importam um com o outro e que mais cedo ou mais tarde eles vão ceder.

Enfim, não achei que esse segundo volume superou o primeiro em qualidade e emoção, mas foi uma boa continuação que só atiçou ainda mais minha curiosidade pelo desfecho que deve sair em 2023. Pra quem gosta de alta fantasia, RPG, guildas, campanhas e muitas reviravoltas de tirar o fôlego, são livros mais do que recomendados. Os pontos que, pra mim, foram negativos são super contornáveis quando pensamos na grandiosidade da história e do que aparentemente está por vir.

Me Leve com Você - Jennifer Niven e David Levithan

24 de julho de 2022

Título:
 Me Leve com Você
Autores: Jennifer Niven e David Levithan
Editora: Seguinte
Gênero: Jovem adulto
Ano: 2022
Páginas: 288
Nota:★★★★☆
Sinopse: Beatriz e Ezra são irmãos e o principal apoio um do outro. Desde que a mãe deles se casou novamente, a vida dos dois ficou bem mais complicada. Mas Bea sempre fez questão de ocupar o posto de encrenqueira da casa e dar tudo de si para proteger Ez dos adultos. Até agora.
Quando Bea vai embora sem avisar ninguém, a situação do garoto muda complemente – ainda mais dentro de casa. Dividido entre a saudade, a raiva e a preocupação, Ez agora só pode contar com a irmã à distância, já que tudo que ela deixou para trás foi um endereço de e-mail secreto para se corresponder com ele.
Enquanto Bea vai em busca de segredos do passado na esperança de mudar seu futuro e Ez tenta encontrar seu lugar no mundo sem a irmã, os dois vão precisar aprender a confiar em si mesmos até poderem se reencontrar.

Resenha: Me Leve com Você, escrito numa parceria entre David Levithan e Jennifer Niven, é um romance jovem adulto publicado no Brasil pela Editora Seguinte.
O livro conta a história conturbada dos irmãos Beatriz e Ezra, que viviam em cumplicidade num lar que se tornou disfuncional após a mãe deles ter se casado outra vez e eles não darem certo com Darren, o padrasto totalmente abusador. Bea enfrentava os adultos pra tentar proteger o irmão, mas um dia ela decidiu fugir de casa deixando escola e família pra trás. Ezra ficou inconsolável, se sentiu abandonado e arrasado, pois seu porto seguro era a irmã, mas talvez houvesse um fio de esperança, já que Bez deixou um endereço de email secreto para que eles pudessem se falar as escondidas. Eles começam a se comunicar, e, de um lado, enquanto Ez conta sobre os problemas que anda enfrentando desde a partida de Bea, do outro lado, ela deixa claro que, embora se culpe por ter deixado o irmão, está atrás de segredos do passado que poderia encontrar com um "cara misterioso", numa tentativa de mudar o futuro até poderem se ver outra vez.

O livro traz uma narrativa epistolar, onde Bea e Ez, que tem um vínculo muito forte, conversam e contam a história de suas vidas trágicas através de emails trocados de forma intercalada. Como são emails, em sua maioria curtos, a leitura não é cansativa, é rápida e flui muito bem, mesmo que em alguns pontos tenha uma pegada de autoajuda. Alguns emails acabam não parecendo ser emails, pois enquanto alguns parecem ser um simples sms, outros são maiores e parecem um capítulo comum narrado em primeira pessoa, onde pensamentos, situações e sentimentos são expostos, assim como sequências consideráveis de diálogos entre terceiros e com os próprios protagonistas são reproduzidos de forma fiel, com travessões e tudo, e não como se eles estivessem contando o que foi dito para soar mais realista. Talvez funcionasse melhor e fosse mais crível se a narrativa não fosse espistolar, porque isso acabou me desconectando várias vezes da ideia de que se tratava de troca de emails entre dois adolescentes.

Tirando esse fato, não há muitas variações de estilo narrativo tamanha a conexão de ideias na história, então nem percebi que o livro foi escrito por dois autores diferentes. Beatriz e Ezra são jovens quebrados, mais infelizes e com sensação de abandono do que nunca, que estão em busca de juntar os cacos se apoiando um no outro, mesmo que estejam distantes, e o leitor vai ficando a par dos acontecimentos a medida que os irmãos vão se abrindo enquanto enviam esses emails, e a história vai se revelando e deixando a gente com o coração em pedaços devido aos traumas dos dois, mas também com um certo alívio por eles teram ajuda, mesmo que de forma bem conveniente em alguns momentos, pra conseguirem se libertar do inferno que viveram na infância causado por pessoas que deveriam protegê-los, para se tornarem pessoas livres do que os fazia mal.

É de uma dor imensa acompanhar a história de dois irmãos que foram negliegenciadas pela mãe quando ela se casa novamente, e parecia não dar a mínima pro fato de que o novo marido causasse estragos psicológicos irreparáveis nos dois. Bea simplesmente não aguentava mais aquela vida e caiu fora depois de ter sido obrigada a amadurecer antes do tempo pra tentar dar conta de enfrentar esses problemas, e como Ez ficou sozinho, acabou tendo que fazer o mesmo enquanto ela o apoiava de longe.

A história trouxe um conceito sobre a solidão que me fez refletir muito: Estar sozinho e sem um lugar pra morar não significa necessariamente que a pessoa está morando nas ruas sem ajuda de ninguém. Às vezes esse sentimento de abandono faz parte, mesmo quando a pessoa está cercada por familiares, e, às vezes, é muito possível ter a sensação de não fazer parte de um lar e se sentir em casa, mesmo que haja um teto sobre a cabeça dela. Nem sempre o acolhimento vem daqueles com mesmo sangue, às vezes vem de pessoas que não fazem parte do círculo familiar, mas que são compreensivas e bondosas o suficiente pra dar o apoio necessário e ajudar quem precisa a seguir em frente.

Pra finalizar, só tenho que falar algo que já é de conhecimento de todos que gostam dos livros e da escrita desses autores: São obras que mexem com os sentimentos, emocionam e tocam lá no fundo da alma, causando angústia e, às vezes, levando o leitor às lágrimas, mas depois eles são capazes de remendar os pedaços e fazer com que a gente possa se recompor.